Assisti a um ritual da água.
Estava num café em Barrancos, e num nicho na parede, junto ao balcão, repousavam duas bilhas de barro.
Aparentemente inúteis.
Velhas, encardidas pela sofreguidão das mãos que as levaram à boca.
A minha ignorância urbana, julgava-as esquecidas, não lhes concedendo sequer as veleidades do artesanato.
Que turismo se desloca a um café de Barrancos para ver duas bilhas abandonadas num nicho?
À falta de espargos com ovos, saboreava um catalão assado, e foi quando me dei conta que os fregueses iam ao pátio encher as bilhas.
Avaliavam entre si a frescura de cada uma, e levantavam-nas acima da cabeça.
Bebiam como os vizinhos espanhois, deixando que a água lhes caísse directamente na boca.
Sem que os lábios tocassem o gargalo.
Mal os ouvia, e a discrição com que se saciavam, não me concedia a oportunidade de ouvir barranquenho.
Creio que é aqui que há tocadores de pedras.
Escolhem-nas entre os seixos do leito seco do Guadiana, e interpretam-nas à maneira que a sede os ensinou.
Como só é possível entre povos que conhecem a graça da água.
de: Jorge Fallorca [1949-Abril de 2014]
do: Jornal da Poesia
A água tem esse fascínio.
ResponderEliminarBeijinhos