ele guiava com mãos cegas
a personagem que lhe tinham confiado
e sua voz ia apresentando
mais que o resto distante do seu corpo,
seguindo a pauta,
- luz que era sua única via,
tão essencial como escassa, escura.
mas o que ele cantava era o extravio,
ser aí um estranho,
estar num palco a enfrentar
quem imóvel o perseguia nas trevas
desde quando inseguro principiara,
já não lhe importava quando nem porquê.
a máscara do seu canto iluminava
o rosto em que fora assumindo
uma loucura oculta:
rostos de muitos, ignorados,
um após outro, usurparam o seu,
que ele reconhecia no silêncio, sozinho.
pródigo, dissipara-se neles,
desfigurado pela ilusão
de holofotes, cartazes, claques dúbias,
- poeira de um campo cujo termo
era longe, não sabia em que longe,
onde acaso ele se encontrasse
num outro, em muitos, em ninguém.
e na sua frente a orquestra sufocante
de ondas secas, sem praia, a persegui-lo.
as minhas palavras são pequeninas para homenagear-te:
Poeta dos Poetas!
ESTARÁS SEMPRE ENTRE NÓS, TU BEM SABES.
23 Novembro de 1930 a 23 de Março de 2015
e porque porque gostas tanto, trouxe-te
BACH, como se fossem flores da Primavera, que renasce para saudar-te
na tua viagem
estilo
Se eu quisesse enlouquecia. Sei uma quantidade de histórias terríveis. Vi muita coisa. Contaram-me casos extraordinários, eu próprio... Enfim, às vezes não consigo arrumar tudo isso. Porque, sabe?
(...) pag 7
As crianças enlouquecem em coisas de poesia.
Escutai um instante como ficam presas
no alto desse grito, como a eternidade as acolhe
enquanto gritam e gritam.
(...)
- E nada mais somos do que o Poema onde as crianças
se distanciam loucamente.
Trata-se do excerto de uma poesia. Gosta de poesia? Sabe o que é poesia? Tem medo da poesia? Tem o demoníaco júbilo da poesia?
há um sentido subjacente ao que escrevo,
a que nenhuma decifração pode restituir
a leitura. não digo que seja secreto, que tenha nascido
de um desejo de ocultar o que é visível, tal
como nenhuma peneira pode esconder o sol. o
que acontece é que ele não se encontra nos dicionários,
não se descobre em listas de sinónimos, e nenhum tradutor
irá descobrir outro vocabulário mais claro
para dizer o que está dito, mesmo que não seja
compreensível para quem procura, na letra,
o que só o espírito conhece. porém não me refiro
à metafísica. a gramática, na sua textura mais simples,
limita-se a transmitir o que é dito para ser assim,
neste movimento mecânico que nos obriga a atribuir
uma significação imediata às palavras. Depois
há uma outra música, que nasce daquilo que, para uns,
se chama a sugestão, e outros interpretam como
o sopro divino. nem uma nem o outro me interessam. o
sentido és tu, na perfeição absoluta com que o som e a imagem
se juntam, para que nada os separe. podem abrir
os tratados de interpretação; ouvir os sábios; discutir
teorias. esta verdade é minha; e quando te encontro,
sob o sentido do que digo, todo o poema
está explicado.